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Xuxa: “Não vou dar às pessoas o prazer de dizer que eu sou uma velha de 60 anos. Eu sou uma vitoriosa de 60 anos”

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Em entrevista ao Vogue Sua Idade, Xuxa comemora a vida com uma série de novos projetos

Com 60 anos recém-completados, Maria da Graça Meneghel, a Xuxa, continua a causar frisson por onde passa. E não só pelos muitos projetos que estão prontos para sair do forno. O primeiro deles, um cruzeiro para comemorar seu aniversário. Mas vem muito mais: até o final do ano ela estreia como protagonista da série Tarã, no Disney+, ao lado de Angélica e Fafá de Belém. Também irá comandar, a partir de abril, o programa Caravana das Drags, na Prime Video, e voltará aos cinemas com Uma Fada Veio Me Visitar, longa-metragem com Thalita Rebouças. A cereja do bolo é o documentário Rainha (nome provisório), feito pelo jornalista Pedro Bial para o Globoplay e que tem previsão de estreia para 2024.

Estrela maior da TV brasileira por décadas, Xuxa começou a carreira como modelo, aos 16 anos. Era a cara da moda no Brasil dos anos 80, onde brilhava em editoriais e propagandas até chegar ao cinema, onde protagonizou um filme em que apareceu nua e que rende assunto até hoje. Logo depois, foi convidada a ser apresentadora do Clube da Criança, programa infantil exibido na extinta Rede Manchete e à época considerado inovador por ser o primeiro a ter desenhos animados mesclados à apresentações musicais e brincadeiras. Seis anos depois, veio o Xou da Xuxa, exibido pela TV Globo aos sábados e até hoje um dos mais lembrados da emissora, ao lado de Xuxa Park e Planeta Xuxa. O resto, é história.

Num tempo em que nem se imaginava redes sociais, Xuxa viveu sob os holofotes e na mira da imprensa: de seus namoros com Pelé, o campeão de Fórmula 1 Ayrton Senna e mais tarde, com Luciano Szafir ao nascimento da única filha, Sasha – tudo o que ela faz, até hoje, dá mídia.
Mas Aos 59 anos, Xuxa está feliz: com a filha, com seu amor, o cantor e ator Junno Andrade e tudo o que está por vir. E foi neste clima que Xuxa conversou com a Vogue Brasil, por telechamada de sua casa, no Rio de Janeiro. Linda, de cara lavada e chiqúissima, de óculos de grau, a apresentadora mais famosa e querida do Brasil falou, sem se intimidar, de tudo: carreira, casamento, envelhecimento, aprendizados, sua relação com a beleza e sexo. Com vocês, Xuxa Meneghel!

Xuxa, você chega aos 60 anos com uma agenda cheia, com o cruzeiro, participações em programas, entrevistas e projetos que estreiam até o final deste ano. Você sentiu que precisava se reinventar?
Eu sempre gostei dessas palavras, reciclar, reinventar. Eu acho que eu sempre precisei disso, desde quando eu entrei na televisão. Sempre busquei fazer coisas diferentes, não queria ser igual a ninguém. Mas eu acho que o mundo hoje precisa disso mais do que antigamente. E se Deus quiser eu acho que vai ter muito mais coisas para eu fazer. Isso é legal para as pessoas saberem que realmente idade não é limitação para nada.

Você também foi colunista aqui no nosso site e mostrou um lado seu que as pessoas não conheciam. Como foi mostrar esse “lado B”?
Muito! Na realidade, na época da coluna eu estava muito sufocada, sentia que eu não podia falar muitas coisas que queria e tive esse espaço incrível de “blogueira”. Eu acho que foi muito importante para mim. Mas eu sempre gostei de me expressar. Tanto que eu usava meu programa para falar de tudo. Eu nunca tive terapeuta, nunca fiz análise. Então, eu chegava, descia da nave e, se não estava bem, eu falava, tipo: ‘Hoje não estou legal, minha mãe está doente’. Mas eu era muito podada. Às vezes, eu falava para a Marlene [Mattos, ex-empresária]: ‘Então responde você. Tudo que eu falo você não concorda, então, responde.’ Era complicado.

Você sofria muita “censura”?
Sim. A Marlene achava que eu nunca deveria falar sobre determinados assuntos. Minha cabeça funciona muito rápido, eu vivo no mundo da imaginação, do lúdico. E eu era muito freada, eu não podia fazer isso. Chegou um momento em que o pessoal da equipe me deixava trancada num quarto e saíam para trabalhar. Eu não podia sair de casa e quando saía, tinham seguranças que avisavam para onde eu ia, quando e que horas voltava, com quem que eu falava, com quem que eu estava andando. A Marlene pegava a minha conta de telefone e sabia para quem eu tinha ligado, quantas horas havia ficado ao telefone.

Se eu fosse dar uma entrevista, antes, a equipe fazia uma sabatina comigo: “Olha, eles vão te perguntar isso, você tem que falar isso. Se te perguntarem sobre política, você diz: sobre esse assunto eu não falo. Senão vão desvirtuar’. O que não é uma mentira. Muitas vezes eu falo assuntos seríssimos. Mas se falo, por exemplo, que transei com o Ju ao ar livre, na praia, é o que vai chamar a atenção, é isso que vai ser publicado.

E essa situação durou quanto tempo? Quando você começou a se rebelar contra isso?
Acho que foram por volta de 14 anos. Teve uma virada de chave, depois do nascimento da Sasha. Quando eu virei mãe, eu não quis mais isso, não queria que minha filha visse que eu era uma marionete, sabe? Quando a Sasha tinha uns dois anos, em 2002, ela deixou de trabalhar comigo. Aí eu comecei a falar sobre vários assuntos. Era tão estranho. Quando eu ia conversar com as pessoas sobre trabalho, muitas diziam: “Caramba, eu não sabia que você tinha tantas ideias, se metia em tudo.’ As pessoas achavam que o cenário não era eu quem havia desenhado, que as brincadeiras não eram ideias minhas. E eu queria fazer tudo, inventar, criar, saber o que estava acontecendo. Até hoje eu sou assim, faz parte da minha personalidade.

Quando você pensa nisso hoje, como você vê esta situação?
Eu precisava de uma pessoa para cuidar de mim, eu confiava nela. Por isso que eu acho que a palavra abuso de confiança é muito apropriada. Porque teve esse abuso bárbaro, do tipo: não fale, não faça isso, anda assim, não veste essa roupa, não diga isso. E eu eu fui fazendo, acreditava que tudo o que ela dizia era para o meu bem. Falando assim, parece que eu fui obrigada. Mas eu sempre digo: ninguém botou um revólver na minha cabeça. Na realidade, eu agia assim porque achava que era o certo fazer, eu confiava muito nela.

Em ensaio clicado para promover o Navio da Xuxa, cruzeiro comemorativo de aniversário que teve shows de Daniela Mercury, Gloria Groove.e Ana Carolina , entre outros — Foto: (Foto: Blad Meneghel)

Xuxa, você por uma época não saía das revistas por conta dos seus namoros, com o Pelé, o Ayrton Senna e o Luciano Szafir. Como foram esses relacionamentos?
Eu tive um relacionamento com o Pelé, de seis anos. Depois eu fiquei dois anos e pouquinho sem ninguém sério. Obviamente eu peguei umas pessoas, mas era só para ficar mesmo… Depois, me relacionei com o Beco (o piloto de Fórmula 1 Ayrton Senna). Ficamos juntos por quase três anos e nos separamos. Mas mesmo assim, ficamos nos encontrando por uns dois anos ainda, até ele começar a namorar sério. Aí não nos vimos mais. Depois que o Ayrton morreu, eu reencontrei o Luciano, que era uma dessas pessoas com quem eu havia ficado, uns dois meses antes. Começamos a namorar, mas ele queria casar e eu queria só ter um filho.

Você nunca quis se casar?
Não tenho nada contra, pelo contrário. Só não acho que seja para mim. Antes do Luciano, eu pensei em ser mãe sozinha, ia fazer inseminação artificial. Mas ter a nossa filha foi uma decisão nossa, até porque a gente estava namorando. Eu gostava de ficar com ele, mas não o suficiente para me casar. Aliás, até hoje é difícil eu falar que eu sou casada com o Ju porque essa palavra me deixa assim meio esquisita.

Como assim?
Eu não gosto porque envolve coisas que eu sou um pouco contra, como ter que assinar um papel, ter que gastar isso, gastar aquilo. Eu acho que quando você ama, não tem essa necessidade. Mas veja, minha filha quis casar e acho que se ela quiser casar de novo com o João e fazer uma baita de uma festa, eu vou estar lá, me descabelando de alegria. Mas não é uma coisa que eu quis para mim.

O Junno é um cara de quem você sempre fala muito, né… O que mudou?
Quando eu me separei do Lu, eu tive mais uns casinhos, mas já achava que, por conta da idade, não iria encontrar ninguém. Mas reencontrei o Ju. Sou louca por ele, apaixonada. E senti vontade de falar sobre esse amor e esse sentimento. Isso chocou muito as pessoas, porque até então, eu não falava nada. Quando eu namorava o Pelé, eu era muito nova, era ele que falava. E eu repetia as palavras dele: ‘Amizade colorida? É, amizade colorida!’ Não sabia nem o que eu estava falando.

Com o Beco, a Marlene achava que não era legal que eu falasse. Então eu me segurava, não falava nem para ele o quanto o amava! Depois, com o Lu, eu não queria um parceiro, eu queria ser mãe. Agora, com o Ju, eu fiquei tão feliz! Eu o reencontrei aos 49 anos. A gente começou realmente a namorar com 50 e foi uma coisa! Pensei na hora: ‘Caraca, é o cara que eu quero viver! Quero morrer do lado dele.’’

E como é este relacionamento Xuxa?
O Ju é ótimo, ele é tremendo, ele é incrível! Estou nas nuvens, digo que estou com cara de bem comida. A primeira vez que disse isso, as pessoas falaram: ‘Nossa, a rainha dos baixinhos falando cara de bem comida? Não combina!’ Talvez se fosse qualquer outra pessoa…. Por exemplo, às vezes eu estou com a Ivete Sangalo e penso: que bacana, ela fala palavrão, ela fala o que ela quer. E está tudo certo, todo mundo aceita, porque já esperam e estão acostumadas com essa imagem dela. A minha, ao contrário, sempre foi muito ligada à Rainha dos Baixinhos, então não pode.

Você sente que as pessoas se assustam com essa sua postura?
Eu acho que a palavra não seria nem assustar, eu acho que era decepcionar. Algumas até hoje não aceitam. Outras acham engraçado, normal. Até palavrão, por exemplo. Eu não falava nenhum até namorar o Ju. A vírgula dele é um palavrão. Então, eu, hoje eu falo mais. As pessoas ainda têm essa imagem minha, assim, meio intocável… Uma vez, na Argentina, um cara falou assim: ‘Se você não tivesse tirado foto nua, você seria quase que uma santa.’ Eu falei: oi? Eu nunca quis chegar a um pensamento próximo disso, ainda mais o cara verbalizar isso. Eu fiquei bastante assustada.

Isso tá bem longe da vida que eu tenho e quero ter ao lado do meu companheiro, entende? Eu tenho fantasias e vontades e ele quer realizar comigo e eu vou realizar com ele. Eu vejo que ficam as pessoas chocadas quando eu falo sobre sexo. ‘Como ela pode falar sobre isso?’ Caramba! E eu pergunto: como eu pude não falar sobre isso a minha vida toda? Como as pessoas puderam achar que uma mulher que não era um fantoche, nem uma boneca que só trocava de roupa e ficava ali na frente do público, não falaria sobre isso, se é uma coisa saudável e normal?

A apresentadora ao lado do namorado, o cantor Junno Andrade (Foto: Blad Meneghel) — Foto: Vogue

Como foi a questão do climatério e da menopausa para você?
Eu entrei na menopausa com 50 anos. Eu não tive essa coisa de calor, de passar mal, nem nada. Só parou. Eu fui ao médico e ele me disse que eu ainda tinha óvulos, ou seja, ainda poderia ovular, mas que eu não estava mais menstruando e que seria bom sim fazer reposição hormonal. Demorei para começar porque eu, toda naturalista, era contra. Mas comecei a me sentir um pouco mais cansada, a meio que esquecer das coisas. Então, vivo com o meu creminho, um dia sim um dia não. Estou bem.

Você não quis ter mais filhos?
Eu me apaixonei pelo Ju pelo pai que ele é com a filha dele. E claro que fiquei pensando que, se eu o tivesse conhecido um ano antes, poderia ter engravidado. Imagina que bacana!
Eu pensava em adotar. Inclusive quando eu fui para Angola, eu conheci um menino chamado Betinho, que tinha sido abandonado pela mãe e morava com o pai, cego. Esse menino grudou em mim e eu fiquei apaixonada por ele. Eu pensei muito, tentei muito, mas lá em Bié, cidade onde ele mora, a adoção não é muito fácil, ainda mais se tem um dos pais. Acabou não acontecendo.

Então essa vontade passou…
Estou num momento de botar essa energia toda para o meu neto que vai vir. Sem pressionar a Sasha, claro. Mas eu estou com 60 anos e eu queria muito ter um netinho para brincar, mimar e “estragar”, como se dizia. Mas eu não vou dizer para você que meu radar não está ligado. Eu visito muitos lugares e se isso acontecer… Eu acho que não tem idade nem data marcada para isso. Se acontecer, eu quero ser mãe e pai de alguém que já estava reservado para mim. Acho que vai ser bater o olho e amar. E aí eu não quero saber se a criança tem 10, 11 ou 12 anos, se é menino ou menina, não quero saber a cor da pele, eu não quero saber nada. Eu quero dizer: é meu filho ou minha filha. E se tiver de ser, vai ser.

Você vai fazer 60 anos daqui a alguns dias. Como encara o envelhecimento?
O envelhecimento para mim é uma questão realmente visual. Eu uso a minha imagem desde os 16 anos, então eu não preciso que alguém chegue para mim e diga: você está velha. Eu sei a cara que eu tenho, eu sei a cara que eu tinha, o corpo que eu tinha e tenho hoje.

Por mais que você possa se encher de creme ou querer fazer milhões de coisas, o colágeno não existe mais, a pele é completamente diferente. Eu faço pequenos procedimentos e tal, mas, na boa, não vai vir. A minha pele não vai mudar muito e nem o meu cabelo. Neste caso, por fatores genéticos: minha mãe teve alopécia e perdeu o cabelo todo. Eu sei que eu nunca vou ter muito cabelo. Não adianta tomar remédio ou passar cremes, não existe isso. Eu estou com 60 anos e acho que as mulheres de 30 têm uma pele, as mulheres de 40, 60, 70, outra e assim vai. A não ser que você morra. Só assim não irá envelhecer.

Com a única filha, Sasha — Foto: (Foto: Blad Meneghel)

A gente tem visto atrizes e cantoras envelhecendo na frente das câmeras e falando sobre isso. Mesmo assim, ainda existe muito preconceito. Você sente isso? E de quem acha que vem essa cobrança?
Eu não me lembro de ter recebido nenhuma ofensa de homens, mas já recebi de mulheres, sobre estar velha. O que não deixa de ser verdade. Mas as pessoas usam essa palavra de um jeito pejorativo: ‘Nossa, mas como a Xuxa está velha. Ela tem tanto dinheiro, por que que ela não usa botox?’ Quando vou olhar, é uma mulher escrevendo isso. Eu não sei se isso é cultural… Eu acho que é porque no Brasil a gente realmente está acostumado a pensar que mulheres bonitas são jovens e tem o costume de achar que velho não serve mais para nada. Não adianta você dizer que você tem maturidade, que você tem experiência. Isso não vale. Para quem usa imagem como eu, desde os meus 16 anos, isso não vale nada. As pessoas não vão valorizar isso.

Eu vi uma vez a Cher e a Tina Turner, no programa da Oprah. Ela pergunta: ‘E aí, como é que está sendo envelhecer? A Cher responde: uma merda. Todo mundo se acaba de rir e a Oprah diz: “Pensei que você ia falar da maturidade, da experiência. E ela fala: foda-se, caguei para isso!’ Eu achei tão incrível! O que a Cher disse, é o que muita gente gostaria de dizer. Principalmente no caso dela, que usa o corpo como ferramenta de trabalho e sempre foi muito criticada por envelhecer, usar tal roupa, namorar homens mais jovens…

Você também se sente criticada por isso?
Eu não vou ser a exceção, sabe? Quer me chamar de velha? Eu estou velha, não adianta. Antes eu me chamava de tia Xuxa, agora já sou vovó Xuxa. Eu quero ser vovó mesmo, então já chama logo. Para aqueles caras que perguntam: ‘Como é que essa velha faz?’, desse jeito pejorativo… Para eles, soa um palavrão e acham que estão xingando: velha! E eu queria muito que as pessoas soubessem que eu não vejo como xingamento. Eu já sei que eu estou velha. Mas eu sou uma pessoa que amo o que eu tenho e o que eu sou. Quando me vejo em fotografia ou trocando de roupa eu penso: ‘Puxa, ainda sou fotogênica, o tempo está sendo legal’, entendeu? Ou seja, dá caldo, tem ainda caminho pela frente, tem coisa para fazer.

Eu acho que, chegar na minha idade e ter um companheiro que me ama do jeito que o Ju me ama, que tem tesão por mim e eu querer falar para as pessoas, é o que importa. E que está tudo certo você, que tem 60 ou 65 anos, ter um companheiro e sentir vontade de ir para um motel e realizar as suas fantasias. Não acho que é se você está com 60, 70, 80 não pode mais transar. Você pode e deve, é legal!

E que bom!
Claro! A idade não pode ser uma limitação para as pessoas, tem que ser vista de outra maneira. Desculpa os mal-amados, mas eu continuo sendo a bem comida da história. Então, se eles me olharem, vão inclusive se perguntar por que eu estou com essa pele ótima. Ok, eu me cuido com a dermatologista, mas eu tenho um homem que me come bem. Isso é saúde! Não vou perder o meu tempo com esse desamor. Eu estou aprendendo muito a lidar com as palavras.

Numa entrevista com o Pedro Bial, você disse que 80% dos seus programas eram politicamente incorretos. Depois, se viu envolvida em declarações polêmicas. Como você lida com essas discussões sobre sexo, racismo?
Depois do Superbonita, quando eu disse que queria ter vindo com a cor da Taís Araújo, eu dei uma entrevista e, com essa coisa da minha paixão por bichos, falei sobre os presidiários. Pensei uma coisa e falei outra. As pessoas começaram a dizer que eu estava falando de presidiários, que são na maioria negros e pobres. Não, eu não estava falando disso, era outra coisa. Mas não importa, não tem justificativa para o que eu disse. Por mais que eu ame bicho, eu estou errada. A Tais [Araújo] falou: você quer que eu te ligue, que eu mande o nome de uma pessoa para você aprender a falar melhor sobre isso?’ Sim, porque tem coisas que eu tenho sim que aprender. Depois daquela paulada que eu levei, eu fiquei pensando em quanta coisa eu ainda tenho que arrumar na minha cabeça.

Depois desses episódios, você começou a estudar mais esses temas, ler mais? Hoje se policia mais antes de falar?
Eu comecei a ler mais. Eu comprei um livro que fala sobre expressões e frases que a gente não deve mais dizer. A Thaís teve um cuidado especial comigo, me deu matérias para ler, indicou uma pessoa para eu seguir no Instagram que fala muito sobre esse assunto, comecei a ouvir e ver palestras… Eu nunca vou saber o que é o racismo. Realmente, nós, brancos, não temos essa noção. Eu tenho outras histórias de vida que podem parecer pesadas para mim, mas nada se compara ou chega perto do que uma pessoa negra. Então, torno a dizer, eu e muita gente temos muito o que aprender. E a gente está só no começo.

Como é que você enxerga essas mudanças que o mundo está passando nesse sentido?
É como levar uma criança para a escola. A gente estava vivendo numa creche onde tudo era permitido e agora a gente está no primeiro, segundo ano aprendendo coisas que a gente não tem nem que pensar, falar e muito menos fazer. Estamos aprendendo como se colocar também em relação a assuntos como gordofobia, capacitismo, pessoas LGBTQIA+ e o uso da linguagem neutra.

Eu acho que esse momento político que a gente viveu também contribuiu para abrir os olhos e fez com que as pessoas realmente mostrassem quem elas são. Enquanto a gente estava nessa momento querendo aprender a falar, ouvir e saber como se comportar e respeitar as pessoas, veio um imbecil que não respeita nada nem ninguém.

Você gosta de se ver no espelho?
Eu olho mais os defeitos do que o que eu tenho de legal, sabia? Eu faço minha ginástica, meu pilates porque eu quero ficar melhor. Aí o Ju passa e fala que eu estou gostosa. Ou seja, eu quero ver os defeitos e ele gosta do jeito que eu estou. Ele não reclama do que eu tenho para oferecer a ele, obviamente apenas gostaria que eu me cuidasse, pela minha saúde. Chegar aos 60 anos e ter uma pessoa do teu lado que não vê os defeitos e tem tesão por você é muito bom. Você exagera menos na autocrítica e se cobra menos.

Você já pensou em fazer algum procedimento?
Eu sempre disse que eu não queria fazer tantos procedimentos ou coisas muito agressivas. Não quer dizer que um dia eu não venha a fazer uma plástica, se tiver vontade. Particularmente, não gosto de bocão ou daquela pele repuxada. Eu paro na frente do espelho e fico assim: ‘Fazer um pescoço ia ser ótimo, mas aí vai ter um corte enorme aqui, eu não vou ter como esconder. Mas se eu fizesse, já aproveitava e puxaria aqui’. Daí eu penso: ‘Talvez mais pra frente…’ Enquanto isso, vou usando as maquininhas, só para me sentir bem. Mas não é qualquer máquina, porque eu odeio sentir dor.

Mas você é contra?
Acho que as pessoas que fazem procedimentos não devem ser criticadas. A gente pode até não gostar, mas elas fazem porque não gostam do que veem no espelho. Aí, têm mais é que fazer. Mas acho que, para algumas pessoas, fazer procedimento deve viciar um pouco, como cigarro ou bebida. Muitas estão perdendo a mão e precisam de alguém para dizer: amiga, para que está demais. Isso não é se meter, é mostrar que gosta.

Eu até já quis fazer uma lipo, porque queria ficar com tanquinho. Mas não sei se o médico sentiu receio por eu ter dito que tinha muito trabalho ou porque eu falei que sentia muita dor, que eu fiz a tal plástica e saí de lá sem sentir nada. E pior: achando que não foi feito como eu queria. No fim, não fiquei satisfeita, vejo meu corpo muito parecido com o que era. Mas isso nunca foi nem uma questão para mim, era só para eu me olhar no espelho e me sentir melhor.

Em mais de quatro décadas de carreira, você tem algum arrependimento? Se você fosse fazer um retrospecto, teria mudado alguma coisa?
Teria acreditado menos nas pessoas, teria falado menos. Teria falado mais eu te amo para algumas pessoas que eu não falei, teria abraçado mais algumas pessoas que hoje eu não posso mais abraçar. Sabe aquela música dos Titãs, Epitáfio? É por aí. Quando você chega a certa idade e vê que as pessoas estão morrendo, desaparecendo de perto de você, você pensa que poderia ter dito e feito mais. Pensando hoje, a Xuxa de 60 anos falaria para aquela menina de 16 anos: ‘Confia menos, se doe menos. Você vai sofrer menos.’ Só agora eu estou aprendendo a fazer isso. Quando eu sinto que gosto das pessoas que estão à minha volta, eu tento em algum momento do dia abraçar, beijar e agradecer. Hoje eu tenho um núcleo muito pequeno que trabalha comigo e eu falo o tempo todo que eles são os melhores, a nata. E um dos pedidos que eu faço é: me cuida.

E o que a Xuxa de hoje diria para a Xuxa em 2023?
Eu não vou dar às pessoas o prazer de dizer que eu sou uma velha (no sentido pejorativo) de 60 anos. Eu sou uma vitoriosa de 60 anos que tem muita vontade de aprender. E quando a gente tem vontade de aprender, a gente faz muita coisa. Então, eu tenho muito pela frente.

Fonte Vogue

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