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Aos 81 anos, Gloria Gaynor está de volta depois de superar dificuldades

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Cantora, dona do hit ‘I Will Survive’, retorna aos palcos com uma banda de dez músicos

Sentada ao piano da casa moderna e clara onde mora, em Englewood Cliffs, Nova Jersey (EUA), Gloria Gaynor conta os planos para o próximo show.

Ela diz que passou muitos anos sozinha no palco, usando playback. Chega. Agora a cantora de 81 anos vai se apresentar com uma banda de dez músicos, incluindo uma seção de metais e três vocais de apoio — nível de profissionalismo de que passou a fazer questão para fechar contrato. “Gloria Gaynor é artigo de luxo. Quem tem cacife, banca”, resume.

Gaynor levou uma vida inteira para poder se exprimir como diva. A cantora, que se tornou a personificação da superação graças a I Will Survive, sua música mais emblemática, confessa que passou anos lutando com a autoestima baixa — e o resultado foi que acabou perdendo o rumo.

Porém, desde que decidiu assumir o controle da vida e da carreira, passou a se sentir à altura da voz segura ouvida em tantas gravações, inclusive o single mais recente, Fida Known, que remete aos anos dourados da disco music, mas também soa muito atual. “A sensação é de ser uma borboleta saindo do casulo”, confessa.

Nascida Gloria Fowles, ela foi criada em uma família grande em Newark, Nova Jersey, apesar de não ter conhecido o pai, cantor de boate. A mãe, conhecida por todos como Queenie May, era uma mulher bondosa, sem papas na língua e dona de uma bela voz. Aos 12 anos, Gaynor foi vítima de abuso, cometido por um dos namorados da mãe, segundo ela mesma revela em entrevistas. Manteve a agressão em segredo durante décadas, escondendo-a até dos leitores do livro de memórias que lançou em 1995, Soul Survivor.

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Ainda adolescente, a mãe reconheceu seu talento ao ouvi-la cantar o clássico do jazz Lullaby of the Leaves. Queenie May incentivou muito a filha na época em que mantinha mais de um emprego de dia e cantava em boates à noite, mas não viveu para ver seu grande sucesso, morrendo de câncer de pulmão em 1970, quando Gaynor tinha 27 anos e ainda lutava para ser reconhecida.

Seu primeiro sucesso veio em 1975, Never Can Say Goodbye, regravação do sucesso de 1971 dos Jackson 5. Graças à batida ininterrupta, aos arranjos de cordas exuberantes e à voz vibrante de Gaynor, a música estourou no mundo e foi a primeira a encabeçar a recém-criada parada Disco/Dance da revista Billboard.

Como surgiu ’I Will Survive’

Gaynor estabeleceu um padrão para o gênero, de acordo com o crítico e historiador musical Vince Aletti, um dos primeiros jornalistas a levar a disco music a sério. “As mulheres dominavam a pista de dança há anos, mas Gloria foi a primeira a oferecer um som poderoso. Deu para perceber que ela tinha chegado para ficar”, relembra ele.

Foi eleita a Rainha Disco, mas o título não foi criado só como propaganda para vender shows: em 1975, em cerimônia em Manhattan realizada pela Associação Internacional de DJs do gênero, Gaynor, de longo, parecia radiante ao ser coroada e receber o reconhecimento dos organizadores.

Entretanto, permanecer no topo é complicado — e suas perspectivas não se mostraram nada animadoras anos depois, quando caiu de costas sobre um monitor de palco durante apresentação no Beacon Theater, em Nova York. Submetida a uma cirurgia, teve uma recuperação complicadíssima.

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Foi quando veio I Will Survive. Composta por Dino Fekaris e Freddie Perren, dupla que havia trabalhado anteriormente para a Motown, a música combinava perfeitamente com Gaynor que, com convicção total, cantou a traição que sofreu e a volta por cima, libertando-se e seguindo adiante, para uma vida independente, de cabeça erguida.

Ela sabia que a canção era boa, mas a gravadora a relegou ao lado B do single de 1978, Substitute; apesar disso, e fazendo jus ao nome, I Will Survive (Eu vou sobreviver, em português) recusou a insignificância — e graças aos DJs que viraram o disco, chegou ao primeiro lugar na Billboard Hot 100 e levou o Grammy.

“Assim que a música começava a tocar, dava para sentir a empolgação e o otimismo no ar”, diz Aletti. “Era incrível. Ela cantava para todo mundo na pista de dança.”

I Will Survive se tornou não só a música símbolo de Gaynor — que afirma nunca se cansar de cantá-la —, mas também um hino eterno de superação das dificuldades e da opressão. Até hoje é considerada uma das melhores faixas da dance music de todos os tempos. Em 2016, a Biblioteca do Congresso a incluiu no Registro Nacional de Gravações, coleção de músicas norte-americanas consideradas “marcantes em termos culturais, históricos e estéticos”.

“Agora é mais uma música que fala de vitória. Eu a canto para os outros, torcendo para que ajude as pessoas a chegar onde cheguei e ir além. Sim, porque hoje sou bem-sucedida, não preciso mais lutar para sobreviver.”

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Auge, anos difíceis e retomada

Quando a música começou a fazer sucesso, ela se casou com um ex-funcionário do Departamento de Trânsito de Nova York que se tornou seu empresário. De acordo com Gaynor, ele gostava de se divertir com a elite badalada e de gastar o que ela ganhava.

Gloria Gaynor em sua casa em Englewood Cliffs, Nova Jersey (EUA)Elianel Clinton/The New York Times

Não parou de fechar contratos de shows para a mulher nos anos 1980 e 1990, e ela conquistou um prestígio especial na Europa, onde cantava com playback porque era mais barato do que contratar uma banda de apoio. Ela aprendeu a fingir e a tolerar a farsa. Quando um apresentador de TV britânico questionou a agenda exaustiva, afirmou que adorava viajar. Depois, confessou que se manteve casada porque não se sentia digna de ser amada.

Mesmo depois de tantos anos de estrada, Gaynor nunca perdeu a voz macia e poderosa. Em 2001, no show em comemoração a Michael Jackson, no Madison Square Garden, dominou o palco, gigante no vestido dourado e turbante com pedrarias, em uma interpretação emocionante de I Will Survive, com direito ao acompanhamento de uma orquestra completa.

Embora Gaynor continuasse sendo uma grande atração no exterior, na terra natal a fama ficou comprometida por anos de gerenciamento ruim da carreira. “Tenho certeza de que ela gostaria de ser mais popular nos EUA, mas é difícil vender ingressos para seus shows”, admite Stephanie Gold, a atual empresária.

Em 2005, Gaynor finalmente se divorciou, dedicando a década seguinte a reconstruir a vida e carreira. Inspirada por uma matéria da revista Architectural Digest, construiu uma casa nova, a mansão de quase 500 metros quadrados em Englewood Cliffs, com uma escadaria digna de qualquer diva, cozinha espaçosa (ela gosta de inventar receitas, incluindo o frango que leva seu nome) e dois leões de pedra guardando a entrada. “Sempre quis ter leões”, confessa.

Em junho, ela lançará um EP de dance pop Happy Tears, que se encaixa perfeitamente em seu catálogo de canções alto astral, que falam de vencer as adversidades. E o momento não poderia ser mais propício, pois está sendo redescoberta, graças, em parte, ao documentário de 2023, Gloria Gaynor – I Will Survive e pelo filme biográfico, de 2024, I Will Survive: The Gloria Gaynor Story.

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“O tempo em que fiquei afastada me ajudou a sair das sombras, a me expressar e a ser quem eu sou, mas menos arrogante.” Sorrindo, completa: “Acho que acabei de descrever o conceito de humildade”.

c. 2025 The New York Times Company

Fonte R7

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