Carnaval
A polícia amedrontada: forças de segurança sofrem ataque acintoso e pretensamente pragmático
Policial ser assassinado, por exemplo, é visto como mera banalização do mal
Sob os bumbos e as cuícas de Momo, as forças policiais estão passando por um desgaste que as incomoda, que tem um lado acintoso e outro pretensamente pragmático. Parece enredo de Carnaval, mas não é, porque as duas coisas se fundem.
Tenho recebido muitos contatos de policiais, de forma unânime indignados com as críticas generalizadas que recebem. Vejamos, então, os principais posicionamentos de quem ataca e de quem defende. Atualmente, isso é tarefa nada fácil.
Por partes insofismáveis. Os assassinatos com intenção deliberada de matar, dolosos, ultrapassaram a casa dos 40 mil no ano passado, em todo o país. O dado é genérico, mas vou particularizá-lo: a matança acontece mais em São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro.
As atitudes selvagens, típicas de bestas-feras sedentas de sangue, são explicadas por alguns como nefasta consequência da má distribuição de renda. Acredite-se nisso, ou não, claro que a violência nas grandes cidades precisa urgentemente de um freio de contensão.
Para conseguir alcançar tal objetivo, não se pode fechar os olhos para o avanço das facções criminosas, maiores ou menores, pois ao admitir que existam “áreas sob domínio”, isso quer dizer explicitamente que se sabe onde estão os principais esconderijos, onde se instalam escalões hierárquicos do crime para comandar marginais recrutados.
Este é um fato. Por trás disso, existe uma horda de pensadores, que se consideram intelectuais do pensamento, que representam um policiamento do ato de pensar – isto pode, aquilo não. Imaginam ser um privilégio de superioridade, exclusivamente deles.
Já está provado que não é assim: eles se concedem o poder invisível de falar e entender de todos os assuntos, entre eles os criminais. Na verdade, pouco entendem desses assuntos, embora pretendam ser bússolas em tais questões.
Proliferam também as ideias concebidas a priori, como se tivessem sido elaboradas por critérios de racionalidade e um mínimo de bom senso. Nesse caso, o “só sei que nada sei”, de Sócrates, o filósofo grego, é fundamental. O saber não pode encobrir o que sabe. Para ensinar, exige-se primeiro saber.
A relação indispensável com a realidade não pode mais ser protelada. É preciso admitir que não se pode girar em torno daquilo que não se sabe. Como a prática não é essa, o crime organizado ganha espaços cada vez maiores numa sociedade desorganizada por culpa de seus administradores e pensadores. Um naufrágio existencial
Você bem sabe como é: a lavagem de dinheiro lubrifica. Ideias são igualmente lavadas, comportamentos sociais são sujos, o que chamamos de “mercado” também camufla essa sujeira.
Como somente se lava o que não é nada limpo, a sociedade é eterna vítima do poder nefasto das drogas, das quadrilhas organizadas, dos dependentes do crack (a pedra sintética), os ceifadores da vida pela eliminação física, a corrupção dominante mostrando que organização criminosa só existe com complacências múltiplas, algumas inimagináveis.
Mata-se, e muito, o que é mais do que selvagem, mas também temos golpes, falcatruas, estelionatos, fraudes, assaltos atemorizantes, corrupção… o desfile na passarela do cardápio penal é extenso. Pensamento de esquerda ou de direita? Mantras do parlamento inglês, sua origem.
VAMOS DEIXAR BEM CLARO
O Conselho Nacional de Justiça, órgão controlador do Judiciário, decidiu recomendar aos magistrados brasileiros que adotem uma linguagem mais simples, compreensíveis por todos na sociedade.
O ato de redigir sentenças deve ser em linguagem que seja direta e concisa, explicando quais são os efeitos de uma decisão judicial para a população. Relatar e decidir não devem ser descritos num processo como se fossem exibição de cultura. Já era? Ainda não é.
O lero-lero semântico, ou juridiquês, confina o espetáculo das palavras numa bolha. E inspira um traslado para os pensadores das políticas criminais, deixando muito bem claro aquilo que se pretende dizer. Atualmente, está obscuro. O espelho não reflete. Está embaçado.
Na esfera criminal, vivemos esse momento de embaraço. A ótica para constatar, verificar e agir, carecem de um macroscópio e não de um microscópio. Algo como procurar enxergar não a árvore isolada, mas toda a floresta.
Nosso momento inclui a Baixada Santista, com seus confrontos violentos após o assassinato de policiais militares, e ainda o papel celofane cor-de-rosa da “cultura” e da “liberdade de expressão”, incluindo-se nelas as poesias (a rigor, as almas da literatura).
Na turbulência, ação policial é sempre “letal”, “vingança” e “justiçamento”. Isto é: seriam, dizem, afrontas à lei e aos direitos que todo ser humano tem. Os violadores dos legítimos direitos, entretanto, não são questionados em momento algum.
Policial ser assassinado, por exemplo, é visto como mera banalização do mal. Vítimas da barbárie são solenemente ignoradas, embora disseminadas com muita dor em toda a sociedade, indignada, angustiada e atemorizada. Bálsamo minimamente com solador para as enlutadas famílias de policiais assassinados? Ou as vítimas trucidadas por bandidos a cada dia? Nem pensar.
Reflexo da cegueira deliberada no último Carnaval paulista: escola de samba desfilando com fantasias de presidiários, idealizados como exemplos sociais, perseguidos por fantasiados como demônios com chifres e escudos balísticos com a inscrição “choque”, alusivos à tropa de choque da Polícia Militar.
Não há direito absoluto. Pensar não é ofender, cultura não é afrontar e desmoralizar, polícia não é serpente do mal Se assim pudesse ser, quem estivesse em situação de perigo não ligaria para o 190 e sim para o PCC.
A quem serve tais pensamentos e manifestações? À sociedade, evidentemente que não. À Polícia Militar, cabe o policiamento ostensivo e a preservação da ordem. É imperativo constitucional. À Civil, a apuração de infrações penais. Está escrito na Carta Magna.
Independentemente da lei maior, existem os fatos, a realidade, a que todos estão assistindo. Carnaval: céu para presidiários, inferno dos policiais? Quem acreditar nessa fantasia momesca, pode se apresentar. Pedirei um autógrafo.
O poder de se mostrar em público e de governar é perversamente corrupto ao não representar o povo e sim os interesses bem pessoais. Nós, sociedade, ficamos como marisco entre o mar e o rochedo. Vítimas. Cobaias involuntárias. Não queremos mais isso. Queremos que se faça a verdadeira justiça, nunca seletiva. Queremos paz, este sim um direito profundamente humano.
Fonte R7