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Após 100 dias de governo: os desafios do Prefeito Dr. Custódio para a continuidade administrativa


A cerimônia de posse do prefeito Dr. Custódio Tavares Dias Neto, realizada no primeiro dia deste ano, marcou não apenas o início de uma nova administração municipal, mas também a continuidade de um projeto político que já governa Indaiatuba há quase três décadas. Este fato, por si só, merece uma reflexão mais aprofundada sobre o significado da continuidade administrativa em uma cidade que se transformou radicalmente neste período.
Quando observamos a história política de Indaiatuba, percebemos que a cidade viveu diferentes ciclos administrativos desde sua emancipação política em 1859. No entanto, nenhum deles teve a longevidade do atual grupo político, que iniciou sua trajetória com Reinaldo Nogueira e agora chega ao seu mais recente capítulo com Dr. Custódio. Esta continuidade, rara no cenário político brasileiro, nos convida a refletir sobre suas causas e consequências. A primeira pergunta que se impõe é: o que explica esta longevidade? A resposta mais imediata, e talvez a mais óbvia, está nos indicadores de qualidade de vida que colocam Indaiatuba entre as melhores cidades do país para se viver. O eleitor, pragmático em sua essência, tende a renovar o contrato com quem apresenta resultados tangíveis. No entanto, esta explicação, embora verdadeira, é insuficiente.
Ex-Prefeito Reinaldo Nogueira, Vice-Prefeito Luiz Carlos Chiaparine, Prefeito Dr. Custódio Tavares e Ex-Prefeito Nilson Gaspar.
É preciso compreender que a continuidade administrativa em Indaiatuba se construiu sobre uma base mais complexa, que combina eficiência na gestão pública com uma habilidosa articulação política. O grupo que governa a cidade soube, ao longo dos anos, renovar-se internamente sem perder sua identidade, incorporando novos quadros e adaptando-se às mudanças sociais e econômicas sem abandonar seus princípios fundamentais.
Dr. Custódio representa bem esta dinâmica. Diferentemente de seus antecessores, que tinham uma trajetória política mais tradicional, ele construiu sua carreira inicialmente na área da saúde, como cirurgião-dentista, e depois na administração pública, como diretor do Departamento de Saúde Bucal. Sua ascensão à prefeitura simboliza a capacidade do grupo político de se renovar e de formar novos líderes a partir da experiência técnica e administrativa.
Esta renovação dentro da continuidade é um fenômeno que merece ser analisado à luz da história política brasileira. Em um país onde a descontinuidade administrativa é quase uma regra, Indaiatuba apresenta-se como uma exceção que desafia as teorias mais pessimistas sobre nossa cultura política. Aqui, o eleitor parece valorizar mais os resultados concretos do que as promessas de mudança radical, mais a competência administrativa do que o carisma pessoal.
No entanto, a continuidade também traz seus próprios desafios e riscos. O primeiro deles é a tendência à acomodação e à perda de capacidade crítica. Quando um grupo político permanece muito tempo no poder, é natural que se estabeleça uma zona de conforto que pode comprometer a inovação e a capacidade de responder a novos problemas. O segundo risco é o enfraquecimento dos mecanismos de controle social e de participação cidadã, essenciais para a vitalidade democrática.
Dr. Custódio assume a prefeitura em um momento particularmente desafiador. Indaiatuba, que já ultrapassou os 260 mil habitantes segundo o último censo do IBGE, enfrenta os dilemas típicos das cidades médias em acelerado processo de crescimento: pressão sobre a infraestrutura urbana, aumento da demanda por serviços públicos, especialmente na saúde e educação, e os complexos problemas de mobilidade urbana.
Além disso, a cidade precisa equilibrar seu desenvolvimento econômico, fortemente ancorado na indústria e nos serviços, com a preservação de sua identidade cultural e de seu patrimônio histórico. O crescimento acelerado das últimas décadas transformou profundamente a paisagem urbana, e muitos indaiatubanos mais antigos já não reconhecem a pacata cidade de outrora nos modernos condomínios e shopping centers que hoje dominam certas regiões.
Neste contexto, o novo prefeito terá que demonstrar que a continuidade administrativa não significa imobilismo ou falta de visão crítica. Pelo contrário, será necessário revisitar algumas políticas e práticas estabelecidas, adaptando-as aos novos tempos e desafios. A experiência acumulada pelo grupo político no governo pode ser um ativo valioso, desde que não se transforme em resistência à inovação e à mudança.
Um exemplo concreto deste desafio está no Plano Diretor da cidade. Elaborado inicialmente na década de 1960 pelo arquiteto e urbanista Jorge Wilhelm, e atualizado várias vezes desde então, o documento precisa de uma revisão profunda que considere não apenas o crescimento físico da cidade, mas também as novas demandas por sustentabilidade ambiental e inclusão social. O traçado do Parque Ecológico como principal vetor urbanístico, uma visão ousada quando foi proposta, precisa agora ser complementado por estratégias que enfrentem os problemas de mobilidade urbana.
Outro desafio importante está na área cultural. Indaiatuba possui um rico patrimônio histórico e cultural, que inclui desde edificações do período colonial, como a Igreja Matriz de Nossa Senhora da Candelária e o Casarão do Pau Preto, até manifestações culturais tradicionais, como a Festa da Candelária, o Japan Festival e a Festa da Tradição de Helvetia. A preservação deste patrimônio, recentemente fortalecida com o reconhecimento da Festa da Tradição de Helvetia como Patrimônio Cultural Imaterial do município, exige políticas públicas consistentes e continuadas.
A administração do Dr. Custódio terá também que lidar com as expectativas de uma população cada vez mais diversa e exigente. Os novos moradores, atraídos pela qualidade de vida e pelas oportunidades econômicas, trazem consigo demandas e visões de mundo que nem sempre se alinham com as tradições locais. Integrar estes novos indaiatubanos à vida da cidade, sem perder a identidade cultural construída ao longo de quase dois séculos, é um desafio que exigirá sensibilidade e visão estratégica.

Por fim, é importante lembrar que a continuidade administrativa, por mais bem- sucedida que seja, não pode prescindir da renovação das ideias e das práticas. A história nos ensina que mesmo os melhores projetos políticos podem se esgotar quando perdem a capacidade de se reinventar e de dialogar com as novas realidades sociais.
O discurso de posse do Dr. Custódio, ao enfatizar que “inicia-se um novo tempo em nossa cidade”, parece reconhecer esta necessidade de renovação dentro da continuidade. Resta saber se sua administração conseguirá traduzir esta intenção em políticas públicas inovadoras e em uma gestão que, mesmo mantendo-se fiel aos princípios que fizeram de Indaiatuba uma cidade de referência, seja capaz de enfrentar os novos desafios com criatividade e ousadia.
A história de Indaiatuba, desde os tempos em que era apenas um bairro rural de Itu até sua transformação em uma das principais cidades do interior paulista, é marcada por ciclos de mudança e adaptação. O atual ciclo político tem sido o mais longo e bem-sucedido. Sua continuidade com o Dr. Custódio representa tanto uma conquista quanto um desafio. Uma conquista porque demonstra a maturidade política da cidade; um desafio porque exigirá a difícil arte de preservar o que deu certo sem temer as mudanças necessárias.
Como observadores e participantes da vida pública de nossa cidade, devemos acompanhar com atenção crítica, mas também com espírito construtivo, os primeiros passos desta nova administração. Afinal, a qualidade da democracia local não se mede apenas pela alternância de poder, mas principalmente pela capacidade das instituições e dos cidadãos de promoverem o bem comum, seja na continuidade, seja na mudança.
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