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Economia

Crise da Americanas lembra aspectos da falência do Mappin

Foto: REUTERS / Sergio Moraes
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Sobretudo para quem já passou dos 40 anos, a crise que hoje abate as Lojas Americanas pode remeter em alguma medida ao apagar das luzes do Mappin

Caso estivesse na ativa, o Mappin, a primeira loja de departamentos de São Paulo, estaria perto de completar 110 anos.

Aberta em novembro de 1913 no centro da capital paulista, a empresa se fortaleceu nas décadas seguintes graças às vendas expressivas e ao prestígio raro -era o lugar para ver e ser visto. Porém, seu epílogo nos anos 1990 foi desolador, marcado por fraudes e endividamento crescente.

Sobretudo para quem já passou dos 40 anos, a crise que hoje abate as Lojas Americanas pode remeter em alguma medida ao apagar das luzes do Mappin, outrora uma gigante do varejo.

Na quarta (11), o executivo Sergio Rial anunciou que deixava o comando da Americanas apenas dez dias após assumir o cargo e apontou problemas contábeis na companhia, envolvendo R$ 20 bilhões relacionados a dívidas com fornecedores.

Em 1996, a empresária Cosette Alves, que detinha o controle acionário do Mappin desde 1982, aceitou a proposta de Ricardo Mansur, um outsider no ramo do grande varejo, pelo valor estimado no mercado entre US$ 20 e US$ 25 milhões.

Àquela altura, a empresa registrava prejuízos. “Foi um período extremamente difícil da economia brasileira. Tivemos estagnação da economia, inflação, juros altos, passamos por diversos planos de estabilização. Talvez, também, nós tenhamos retardado um pouco o nosso processo de reestruturação, necessário para que a loja tivesse uma melhoria na parte operacional”, disse Cosette à Folha de S.Paulo dias depois de sacramentar a venda.

Mansur anunciou novo fôlego para a companhia, mas o que se viu foi o contrário. Três anos depois da aquisição, a empresa teve a falência decretada. Naquele momento, Mappin e Mesbla (outra rede adquirida por Mansur) deviam cerca de R$ 1,2 bilhão (R$ 9,4 bilhões em valores corrigidos) a fornecedores, bancos, funcionários, investidores, Receita Federal e governos estaduais.

“No Mappin, os indícios de fraude são gritantes”, disse à Folha de S.Paulo na época o advogado Alexandre Carmona, síndico da massa falida.

Em 2011, a Justiça condenou Mansur em dois processos criminais a uma pena de 11 anos e meio de prisão por gestão fraudulenta no Mappin e no banco Crefisul. Quase uma década depois, o empresário passou a cumprir prisão domiciliar.

Três anos atrás, um sinal de retomada. A Marabraz relançou a marca Mappin, agora no comércio online, voltada a produtos de cama, mesa e banho, além de decoração. Era uma iniciativa modesta diante do que a loja havia representado no século passado para o comércio varejista, mas ao menos mantinha a marca viva.

Hoje, porém, o endereço online tal qual foi lançado (mappin.com.br) está inativo. A reportagem procurou o departamento de marketing da Marabraz, mas não obteve resposta até a conclusão deste texto.

‘A NOSSA MACY´S’

Os derradeiros anos do Mappin não fazem jus ao que a loja representou para a vida econômica e social de São Paulo.

Aberto pelos britânicos John Mappin e John Kitching num momento em que a população da cidade não chegava a 400 mil habitantes, o Mappin logo se tornou um símbolo de elegância, principalmente para uma elite ligada ao café (fazendeiros e negociantes). A crise de 1929, no entanto, obrigou a loja a se adaptar a um novo cenário, diversificando seu público consumidor.

Manteve, contudo, a aura de sofisticação e a identidade com a cidade que se expandia. “Quando eram namorados, nos anos 1940, meus pais tinham a entrada do Mappin como ponto de encontro”, conta Jaime Troiano, diretor da TroianoBranding, empresa dedicada a estratégias de marca.

Ao falar do Mappin frequentado por seus pais, Troiano se refere ao prédio em estilo art déco na praça Ramos de Azevedo, em frente ao Theatro Municipal, para onde a loja se mudou em 1939. Antes, tinha ocupado dois outros endereços: a rua 15 de Novembro, onde foi inaugurada, e a praça do Patriarca.

“O Mappin representou para os paulistanos um olhar para o Primeiro Mundo. Era a nossa Macy ‘s”, diz o consultor, citando a loja de departamentos de Nova York, aberta em 1858. Ele se recorda especialmente das “espetaculares vitrines de Natal”.

“O Mappin se tornou uma referência muito forte para os consumidores, que iam ao centro paulistano para ver os lançamentos e as liquidações”, afirma Eugenio Foganholo, sócio da consultoria de varejo Mixxer.

Segundo ele, Ricardo Mansur ajudou a afundar a empresa nos anos 1990, mas o declínio do Mappin havia iniciado duas décadas antes.

Para entender esse processo, diz o consultor, é preciso levar em conta que os formatos do varejo têm ciclos de vida. “No Brasil, um formato que perdurou por bastante tempo foi a loja de departamentos, na qual, sob um único teto, havia uma oferta varejista muito ampla: móveis, calçados, roupas, alimentos, eletrodomésticos, entre tantos outros”.

Nos anos 1970, começaram a ganhar força novas práticas de comércio que desafiavam as lojas de departamentos. São três formatos principais que reviraram as peças desse xadrez varejista, segundo Foganholo: 1) as redes especializadas, como C&A (confecções) e G. Aronson (eletrodomésticos); 2) os shoppings, como Iguatemi e Ibirapuera; 3) os hipermercados, como o Carrefour.

“São transformações que passaram a minar as lojas de departamentos”, diz o consultor. “A partir daí, o varejo começou a se deslocar do centro de São Paulo para as áreas radiais, tirando fluxo do Mappin”.

Foganholo apresenta esse panorama para evidenciar as diferenças entre as crises do Mappin, que foi à falência, e da Americanas, cujo futuro é incerto. No primeiro caso, havia um novo contexto do varejo, que levou à decadência da loja -e Mansur acabou de enterrá-la. No segundo, a situação é, segundo ele, pontual: “Negócios como o da Americanas estão em crescimento, não têm tendência de desaparecer”.

Crise vai, crise vem, o comércio pode fechar. Mas as marcas, quando fortes, são capazes de resistir, acredita Troiano. “As ações de Mansur afetaram o Mappin como negócio, mas não mexeram com a imagem idílica que guardamos da loja”, diz o consultor, que arremata: “É a nostalgia”.

Fonte Jornal de Brasília

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